NPCvP - Filhos de Magia - Chandra V. Harper

Aterrorizada. Completamente aterrorizada, mas não surpresa. Era esse o meu estado de espírito diante do novo método de treinamento que meu irmão nipônico havia preparado especialmente para mim, já que geralmente nossas conversas terminavam com ele falando em algum ditado esquisito que não tinha o mínimo sentido, ou mesmo com um de nós balbuciando indignações aos quatro ventos em nossas línguas originais.
Certamente havia uma barreira cultural intransponível entre mim e "Hikari-san", mas achei uma completa baixaria da parte dele usar nossa discrepância de realidades para me transportar para outra realidade e travar uma luta contra o que parecia ser o vilão de algum tipo de filme noir futurista, em que a mocinha se apaixona pelo seu futuro assassino, num campo de batalha virtual.
O tal Kyle obviamente não era um humano comum, e tampouco estava preocupado com meu bem estar. Na verdade estava escrito nos olhos dele que se eu não estivesse à altura das suas habilidades, ele arrancaria meu fígado com as mãos nuas e faria um foie gras de Chandra, para comer com torradinhas e vinho branco.
Tentei lembra do que já havia lido dos livros emprestados por meus irmãos no chalé, e ainda do que havia visto eles fazerem. Se Ai não estivesse brincando sobre o fato dos nossos poderes serem ampliados, eu acho que conseguiria realizar alguns feitiços mais complexos sem as frustrações de sempre.
Ergui a mão e gesticulei, desenhando um pequeno selo no ar, tentando fazer com que Kyle fosse engolido pelas trevas, me dando um tempo a mais para pensar no que fazer e lembrar de como meus outros irmãos conseguiam dominar tão bem as artes mágicas.

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Claramente, eu havia realizado um encantamento totalmente principiante, facilmente dissipado por um feiticeiro poderoso, laia qual Kyle parecia se enquadrar bem, afinal, poucos os que podem manter um universo particular.
Tendo as trevas sido recortadas com um feitiço luminoso, a próxima coisa que vi foi um clarão, mas não de luz comum. Era fogo, mais precisamente, um lança-chamas conjurado para me transformar em uma fornada de cigana ao Barbecue.

"ÁGUA! ÁGUA! ÁGUA! ÁGUA!"
O pensamento era recorrente e ecoava dentro de mim, a ponto de transbordar. Fosse por influência do perigo ou da força mágica que ampliava meu poder, meu corpo reagiu instantaneamente. Das minhas mãos erguidas brotava uma torrente, que seguia rumo ao fogo tão rápido quanto ele vinha, no intuito de apagá-lo.
A atitude estúpida estampada no rosto másculo de Kyle me irritava ainda mais que a sua cara de entojo quando foi conjurado por Ai. De algum jeito, eu teria inverter os papéis da batalha, e ser a Britney em 2007, não o carro do paparazzi, e não poderia fazer isso apostando nos guarda-chuvas errados. Com outro maneio rápido, consegui dar forma a minha vontade, fazendo uma ventania gelada seguir a onda, como um efeito extra para tentar causar-lhe algum prejuízo.

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Qualidades e defeitos:

A estratégia não foi de todo ruim, afinal o pilar de gelo estava ali, só que Kyle não! A criatura do Tártaro conseguiu se teleportar para trás de mim e assim que me virei, percebi que agora ele se preparava para dar um tiro de tazer nas minhas costas, e eu não poderia estar mais infeliz com isso.
O cheiro ozônico lembrava um perfume Calvin Klein  vintage, que eu pessoalmente odiava por me lembrar do mafioso que "comprou" meu pai. Kyle estava inconscientemente pisando nas minhas feridas, e no momento a única coisa que eu desejava mais que sair dali, era cravar uma faca no seu peito nu.
Cerrei meus punhos, tentando conjurar um deslizamento de terra e rochas entre nós dois, me concentrando minha força psíquica naqueles materiais para mantê-los unidos em uma parede sólida, qual em tese barraria os efeitos do seu relâmpago. Tentei ainda fazer com que algumas das espadas estilhaçadas, antes fincadas no solo da colina, levitassem e se atirassem velozmente em sua direção, embora não pudesse vê-lo por trás da parede.
Por mais que não aparentasse, meu sentimento de impotência perante a ele crescia, e tudo o que u queria naquele momento era sentar no chão e chorar por todos os momentos em que já me senti assim, mas isso não me ajudaria em nada a superar esse complexo de inferioridade existencial. A incerteza era o que me acompanharia de agora em diante, inundando minha alma com pensamentos de desesperança.

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Primeiro eu pensei ter sido tola por mandar as espadas em sua direção, e somente agora percebia que havia literalmente cometido uma atrocidade.
Seu corpo estava lá, estirado numa poça de sangue, como um guerreiro rendido, morto sem piedade, bem como Remo na Eneida, e eu, Rômulo (em sua versão mais feminina e oriental) sofria com meu peito remoendo em culpa o peso do seu assassinato.

— AI! ME AJUDA! KYLE ESTÁ FERIDO!— Gritei ao único espectador da nossa batalha, que poderia ter alguma poção, ambrósia ou néctar que ajudasse a amenizar a situação. Lidar com situações assim não eram nem de longe a minha especialidade, tomava muito cuidado comigo mesma para não precisar de ajuda médica ou mesmo visitar as enfermarias, e teria de dar um jeito de me virar com o pouco que tinha: minha própria magia.
Me aproximei do seu corpo, me ajoelhando ao seu lado e colocando as mãos em seu peito. Não conseguia saber se seu coração ainda batia, mas tentava me concentrar em suas veias, sentir o fluxo do seu sangue e principalmente tentar reconectar quaisquer pontos de fluxo sanguíneo que conseguisse. Faria o que pudesse para prolongar seu tempo de vida, ao menos até que pudéssemos conseguir ajuda do mundo externo, ou que Ai pudesse vir com alguma solução para aquele problema. Me dignei a confortar uma última vez aquele que não sabia ser meu irmão, ou algum outro tipo de espírito mágico, mas que não poderia deixar desamparado:
— Kyle, aguenta firme. Nós vamos te salvar.

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"CUIDADO COM A BURRA! Claro que era armadilha!"

Havia sido levada até a altura dos céus, e de acordo com as perspectivas das leis da física e da queda livre, ele pretendia me transformar em purê ali mesmo.
Me lembrei então de uma cena de filme infantil, em que um avião é destruído, e todos tem que pular no mar para se salvarem, a única vantagem do filme, era uma das personagens poder se transformar num para-quedas.
Tentei improvisar em minha queda, lançando contra mim mesma uma lufada de vento, para tentar retardar minha queda e logo em seguida, pensando no solo, tentando fazer com que a terra tremesse e abrisse um buraco fundo, que seria preenchido com ondas de água salgada lançadas dali de onde eu estava, e por fim tentei fazer surgir uma coluna de água alta, como precaução para amortecimento extra.
O único problema era: Kyle ainda estava ali, e nosso embate era certo. Ele poderia muito bem conseguir desfazer todo meu plano de salvamento, por isso, quando me coloquei em posição de queda, as mãos acima da minha cabeça ficaram responsáveis por emitir um flash poderoso, para ao menos garantir que eu chegasse "segura" ao solo.

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