Treino contra monstros – Cecil e Liodas

O conselheiro do chalé XX caminhava em direção à arena horas após o pôr do Sol, algo contra às regras do acampamento. Alguém do cargo em que Liodas estava não deveria desobedecer uma diretriz tão conhecida, mas ele fazia isso regularmente. Se fosse necessária uma desculpa, ele já possuía uma. “Muitos fazem isso, não sou o primeiro. Posso fazer uma lista de nomes”. Não era a mais honrada, mas ele não se importava com isso.

Diferente dos treinos diurnos, durante a noite haviam monstros de diversos tipos que eram invocados por descendentes de Hécate. Mais uma regra quebrada que o semideus pouco ligava. Diversão e entretenimento, isso era a motivação das ações dos campistas noturnos.

Uma figura não muito aguardada surgiu entre os demais, carregando sua grande foice e se aproximando do albino.

— Não me importo se for esse o caso — disse Liodas ao escutar o que a filha de Thanatos falou. — Acho que não viemos aqui a essa hora para batermos papo, não é? — As pupilas do rapaz quase sumiram por completo numa tentativa de olhar para dentro da cabeça. — Vamos. Já tenho ideia do que podemos enfrentar — apressou a garota enquanto continha uma risada maquiavélica.

Depois de um lestrigão ser transformado numa quantidade incômoda de pó para qualquer um que fosse limpar depois, a dupla de semideuses foi até o invocador da noite. Era um dos irmãos de Proudmoore e, por conta disso (ou pelo olhar psicótico do albino), ele permitiu que aqueles dois furassem a fila de espera no combate contra monstros.

— Tem certeza disso? — perguntou o outro filho de Hécate a Liodas.

O escolhido de Hera assentiu, ansioso. Então um símbolo de invocação surgiu no meio da arena e de seu centro uma figura começou a se formar das luzes e sombras do feitiço. Quando a fumaça que se levantou começou a se desfazer, um homem com cabeça de cão aturdido estava de pé, observando e farejando todos ao redor. Sua expressão de confusão mudou para fúria e com gestos estranhos, fez surgir mais símbolos de invocação, embora um pouco diferentes e muito numerosos por metade da arena.

— Você cuida dos ghouls, eu cuido do telquine — informou Liodas para Cecil. O homem com cabeça de cão havia invocado no mínimo uma dúzia de monstros grotescos, semelhantes a zumbis, embora não estivessem em decomposição. — Consegue cuidar disso, eu acredito. — Ele nem sequer perguntou, apenas deixou as criaturas mais fracas para o combate dela. O monstro versado em magia negra seria o oponente do feiticeiro. Retirando seu colar, ele ativou a Chave da Estrela para ela tomar sua forma de cajado.

Item:

Apesar de ter deixado claro que sua batalha seria com o telquine, os ghouls não pareceram se importar e atacaram o albino. Liodas, como um semideus quase feito de paciência, tocou seu cajado na testa da primeira abominação a se aproximar e utilizou o feitiço gelado para congelá-lo. Aquilo não o mataria, apenas impedia que continuasse a atrapalhar o feiticeiro.

— Hoje eu quero usar apenas as minhas mágicas — explicou aos monstros receosos em atacá-lo. Sem dar atenção a eles, caminhou pelos monstros até ficar com a visão completa do homem com cabeça de cão. — O que mais você sabe fazer além de invocar essas coisas, Totó?

O telquine não pareceu contente em ser insultado, mas aceitou aquilo como um desafio. Abrindo a boca para produzir sons diferentes de latidos, ele começou a demonstrar que era mestre em magia negra — ou show de luzes. Um relâmpago negro foi no encalço do albino que, por muito pouco, não conseguiu desviar do ataque com um salto para o lado, derrubando um ghoul no processo.

“Que fedor”, analisou o cheiro que sentiu depois que desgrudou seu nariz do peito da criatura invocada. Mais um raio veio na direção de Liodas, obrigando-o a rolar pelo chão. O ghoul explodiu com o ataque que lhe acertou em cheio. “Ele é bom”.

Usando a adrenalina que surgiu, o albino se ergueu do chão com a Chave da Estrela empunhada e apontada para o telquine. O feiticeiro parecia contente por ter escolhido aquele adversário para sua batalha.

— Vejamos que tem o raio mais forte. — A partir da ponta de seu cajado, Proudmoore executou seu feitiço relâmpago contra o monstro que também atacou com mais um ataque elétrico. Os dois golpes se acertaram e permaneceram empatados, cada um colocando mais energia no próprio feitiço para tentar superar o ataque do outro. Ambos sabiam que não conseguiriam sair ilesos se fossem pegos pelo feitiço, no mínimo perderiam seus cabelos, ou pelos.

Ghouls começaram a cercar Liodas, prontos para aproveitar a chance de devorarem o rapaz sem serem transformados em picolés. No entanto, o escolhido de Hera não deu atenção. Ele contava com a capacidade de Cecil de resolver aquele problema com sua foice.

“Um dia…”, começou a divagar, “também terei uma foice assim”.

Item:

Poderes utilizados:

A sinfonia que Liodas conseguia ouvir ao seu redor era perfeita para sua situação atual. Um pouco de sangue de vez em quando espirra em suas costas, algo que ele apreciava mais que o normal, principalmente quando não era o seu próprio sangue.

“Já está bom, eu acho”, pensou o semideus antes de interromper o fluxo mágico na Chave da Estrela, parando de lançar seu raio. Acumulando o que já havia sido disparado para o seu próprio ataque, o telquine direcionou toda aquela quantidade absurda de energia para acertar seu oponente.

— Idiota. — Como se espantasse uma mosca com as costas de sua mão, Liodas rebateu o poderoso relâmpago e o fez voltar até o cabeça de cão. — Esqueci de te dizer que aprendi uns truques com a rainha Hera, Totó? Que pena.

Para o prazer sádico do albino e para a infelicidade do monstro, o golpe não transformou o cão em pó espalhado pela arena. Somente queimaduras gravíssimas e um tom escuro de pelos tomou conta pelo corpo do telquine. Foi difícil, mas ele conseguiu se erguer e ainda manter sua fúria estampada em sua face. Liodas retribuiu com um sorriso.

Agora era sua vez de atacar e Proudmoore não hesitou. Balançando seu cajado no ar, começou a produzir uma ideia que possuía e queria colocar em prática há um bom tempo. Primeiro ele invocou água, depois a aqueceu com fogo dentro dela e, por fim, usou o feitiço de pressão para apertar tudo aquilo num só ponto esférico. “Minha criação…”, pensou ansioso com a ideia de usar aquilo num lugar com plateia.

— Vejamos se aguenta isso. — Ao comando do feiticeiro, a esfera brilhante flutuou até a direção do telquine, pousando graciosamente em sua frente. O monstro não compreendeu o sentido daquilo até ser lançado para muito longe por uma explosão enorme que produziu uma cratera onde antes ele se encontrava. — Tente não se mover, ou vamos demorar mais que o necessário com isso — sugeriu Liodas enquanto lançava mais daquelas esferas explosivas.

Enquanto corria por sua vida, o telquine invocava ainda mais ghouls com o intuito de servirem como distração e escudo humano. O albino não se importava, estava louco com a destruição e sabia que ghouls não lhe eram problema algum.

Item:

Poderes utilizados:

Apesar da diversão, Liodas estava se cansando daquela maneira de lutar. Ser filho de Hécate não significava que suas batalhas seriam feitas imprescindíveis de magia. Em sua ascendência também havia o deus da guerra, portanto era impossível para ele saciar sua sede por sangue através de disparos mágicos. Era necessário ver as tripas de seus inimigos, sentir o sabor de ferro de seus sangues e fazê-los se arrependerem por estarem entre o começo e o fim da linha da vida do albino.

— Não se assuste, Cecil — pediu à semideusa. Ele sabia que talvez o aviso não servisse. Poucos teriam estômago para o que seria feito, o que não poderia ser desvisto.

O sorriso sádico de Liodas se desfez, transformando-se em algo que parecia mesclar dor e agonia. Suas costas se curvaram enquanto sua pele se rasgava, suas unhas saltaram de seus dedos, dando lugar a garras. Conforme o corpo do jovem ganhava altura e músculos, sua epiderme se desprendia de maneira nada agradável para os espectadores e para si próprio. Gemidos e grunhidos puderam ser escutados por toda a arena, tomando a atenção de qualquer um que pudesse ouvir ou ver a cena horrível.

Um trio de ghouls começou a se aproximar com cautela, como se não soubessem se o que acontecia ao garoto era uma oportunidade de atacá-lo ou a chance de fugirem por suas pós-vidas. Eles tiveram a resposta mais cedo do que imaginavam, perdendo suas cabeças com uma mera patada da fera branca.

Liodas, agora em sua forma de licantropo, uivou para a Lua Cheia. O telquine engoliu em seco, incapaz de dizer se era páreo para um monstro daqueles, mesmo sendo um também. Devido sua distração, o homem com cabeça de cão acabou se deixando acertar pelo terceiro ghoul que havia se aproximado do lobisomem.

“Como fedem”, pensou Liodas a respeito dos ghouls e dos semideuses que assistiam. “Estão há quanto tempo sem tomar um banho?” O olfato aguçado se mostrou um incômodo para o licantropo naquele campo, mas ele ainda assim avançou com uma velocidade avassaladora até o homem-cão.

As garras da besta branca arranharam o peito do telquine, arrancando-lhe o ar dos pulmões em um grito devido a dor. O ataque continuou, mais cortes foram feitos e mais guinchos caninos foram ouvidos. Nenhum feitiço podia ser conjurado a tempo de defender os golpes rápidos da fera, nenhum ghoul se atrevia a se sacrificar por seu mestre. O telquine somente sofreu durante todos os ataques que recebeu, ele não tinha mais esperanças, nem mesmo ódio. Apenas dor.

— Foi divertido — informou o lobisomem antes de abocanhar o pescoço do homem-cão, transformando em um monte de pó.

Liodas não voltou ao seu normal. Seus olhos ferozes estavam enlouquecidos, incapazes de travar um novo alvo entre tantos mortos-vivos. Porém, ao ver Cecil, ele conteve seus instintos e fez o melhor sorriso que era capaz com aquele focinho.

— Garota da foice. Continue. — Ele não iria matar os adversários dela.

Item:

Poderes utilizados:

Cecil não precisou repetir seu consentimento para que o licantropo de pelos brancos continuasse sua voraz brincadeira. Suas garras pareciam rasgar papel quando tocavam os alvos mortos-vivos. De longe, aquilo poderia ser considerado uma dança onde cada movimento espalhasse um brilho carmesim pelo palco que seria a arena, todavia, não havia brilho no sangue dos ghouls e sua cor variava entre verde e roxo escuro. Além do mais, somente míopes — ou amantes da dor alheia, como Liodas — confundiriam aquela chacina com algo belo.

Houve somente uma pausa na brutalidade daquela cena; o lobisomem precisou cuspir o sangue e pedaço do pescoço de um dos ghouls, visto que o sabor era muito mais desagradável que o do telquine. O restante dos inimigos tentou fugir enquanto isso, o que serviu apenas para aumentar a adrenalina da criatura irrefreável.

Em um dos últimos que haviam sobrado, Liodas acabou se deixando acertar por um golpe da criatura fétida. Se não estivesse em sua forma lupina, quiçá houvesse se machucado, visto que ghouls possuem uma força considerável. Para o azar da invocação, licantropos eram muito resistentes e Liodas era muito cruel. Ele se vingou desmembrando a criatura, um membro de cada vez. Ele deixou o ghoul com apenas um braço para tentar fugir se arrastando.

Após um uivo para a Lua Cheia, o morto-vivo recebeu sua segunda morte ao ter seu coração arrancado por suas costas. Ele nem sequer pôde ver seu assassino nos olhos ao ser morto. O último Proudmoore não possuía esse tipo de honra.

— Nunca morda carne podre — sugeriu para Cecil enquanto retornava à sua forma humana. O som de seus ossos encolhendo, estalando conforme voltavam ao tamanho normal, podia ser escutado por todos os presentes que não estavam vomitando e ainda permaneciam conscientes. — Nem carne de cachorro.

Os dois semideuses abandonaram a arena com seus pertences. Precisavam tomar cuidado para não serem encontrado pelas harpias, embora Liodas fosse difícil de se ver no escuro.

Item:

Poderes utilizados:

Qualidades importantes:

OBS: Não esquecer de calcular os bônus oferecidos pelos poderes em vermelho e a qualidade Regrado.